Uma questão debatida entre os guardadores do Sábado diz respeito à licitude ou não da prática da relação sexual entre pessoas casadas durante as horas sagradas.

Os que sustentam não haver nenhum problema na prática da relação íntima no sétimo dia alegam que ela não é expressamente vedada nas Escrituras, de modo que esse é um ponto que deve ficar a critério da consciência individual. Mas esse argumento é nitidamente falacioso.

A inexistência de preceito que proíba a relação sexual durante o Sábado só seria relevante caso se admitisse que tudo o que não é ostensivamente vedado nas Escrituras, por esse único motivo, já deva ser considerado lícito, o que evidentemente não é verdade.

Que versículo das Escrituras proíbe realizar atividades físicas esportivas em dia de Sábado, como nadar, correr, fazer uma longa trilha, escalar um monte etc.? Que texto inspirado impede que uma pessoa passe as horas do Sábado dentro de lojas, apreciando artigos de vestuário sem o propósito de adquiri-los? Que trecho da Bíblia condena assistir a telejornais, documentários seculares ou outros programas televisivos não religiosos durante o período sabático? Em que parte do Livro Santo ocorre a vedação do estudo de conteúdo secular durante o Sábado, visando, por exemplo, à realização de um exame posteriormente? Aliás, que passagem das Escrituras trata como pecado realizar uma prova no sétimo dia? Algumas declarações de Ellen G. White até poderiam ser invocadas para afastar a licitude de algumas dessas práticas (ver nota 1 no rodapé), reputando-as como erradas, mas onde tudo isso está claramente definido na Bíblia? Nada disso é dito expressamente nas Escrituras Sagradas. E não é dito porque não era necessário dizer.

A Bíblia também não diz que o uso de entorpecentes, como a cocaína, a heroína e o crack, seja proibido. Mas não precisa dizer, pois o assunto é definido principiologicamente. As Escrituras afirmam que o “corpo é santuário do Espírito Santo” (1Co 6:19), que é preciso glorificar a Deus no corpo (1Co 6:20) e que, “se alguém destruir o santuário de Deus, Deus o destruirá” (1Co 3:17). Apenas isso já é suficiente para considerar o uso de entorpecentes como contrário à vontade do Senhor, mesmo que não sejam nomeados especificamente nas páginas inspiradas.

O mesmo se dá com muitas atividades que não devem ser realizadas durante o sétimo dia. Embora não sejam vedadas expressamente, sua prática é incompatível com o caráter e o propósito da instituição do dia de descanso e adoração.

Mas os que defendem a licitude da prática da relação sexual durante o sétimo dia ainda argumentam que o sexo é sagrado e que, sendo realizado no âmbito do casamento, não pode ser errado em tempo nenhum, mesmo nas horas sabáticas. Alegam que, assim como o Sábado, o sexo também foi criado por Deus, razão pela qual é santo. O problema é que esse argumento já começa com uma falsa premissa.

A simples constatação de que algo foi ordenado por Deus e que seja bom não implica que sua prática seja apropriada para o Sábado. O trabalho, por exemplo, também foi instituído por Deus. Foi o próprio Deus que determinou que Adão cuidasse do Jardim do Éden e o cultivasse (Gn 2:15). Mas isso não faz do trabalho algo santo e apropriado para o sétimo dia. Muito pelo contrário: o trabalho é justamente a principal atividade que não deve ser realizada no Sábado (Êx 20:20).

O Sábado é santo no sentido de que está separado dos demais dias para um propósito especial: a adoração a Deus e a realização de Seu serviço. Isso não quer dizer que os demais dias sejam amaldiçoados ou ruins, mas apenas que os outros seis dias são para a prática de atividades comuns, ao passo que o sétimo dia é dedicado exclusivamente a Deus.

As atividades ordinárias dos outros seis dias da semana (limpar a casa, lavar a roupa, consertar coisas, plantar, colher, cozinhar, desenvolver atividade profissional, comprar, vender, realizar pagamentos, estudar matérias seculares, abastecer o veículo, viajar, praticar atividades físicas esportivas, brincar etc.) não devem ser realizadas nas horas sagradas do Sábado. De tudo aquilo que é feito nos outros seis dias da semana, apenas o que for indispensável e extremamente necessário é que pode ser realizado também no Sábado. Afora isso, o dia santo deve ser dedicado tão somente para a adoração a Deus, para a contemplação serena das obras da natureza e para a pregação do evangelho.

O Sábado é dedicado especialmente ao encontro com Deus. É o dia especial de adoração. Por isso é que, mesmo na Nova Terra, “cada semana, aos Sábados” (ver nota 2 no rodapé), todos se reunirão para se prostrar e adorar o Senhor Deus (Is 66:23). Não é um dia para atividades comuns, que são aquelas que podem ser praticadas nos outros dias da semana.

Quando Deus estava para Se revelar sobre o Monte Sinai e proclamar os Dez Mandamentos perante todo o povo, orientações claras foram dadas ao povo, dentre as quais estava a de que, no dia da manifestação divina, os homens não deveriam se chegar à suas mulheres. Observe-se:

Disse também o SENHOR a Moisés: Vai ao povo e purifica-o hoje e amanhã. Lavem eles as suas vestes e estejam prontos para o terceiro dia; porque no terceiro dia o SENHOR, à vista de todo o povo, descerá sobre o monte Sinai. Marcarás em redor limites ao povo, dizendo: Guardai-vos de subir ao monte, nem toqueis o seu limite; todo aquele que tocar o monte será morto. Mão nenhuma tocará neste, mas será apedrejado ou flechado; quer seja animal, quer seja homem, não viverá. Quando soar longamente a buzina, então, subirão ao monte. Moisés, tendo descido do monte ao povo, consagrou o povo; e lavaram as suas vestes. E disse ao povo: Estai prontos ao terceiro dia; e não vos chegueis a mulher. (Êx 19:10-15)

Com isso, não se quer insinuar que o dia da manifestação divina sobre o Sinai fosse um dia de Sábado. Não há informação suficiente para saber o dia da semana em que o Senhor proclamou Seus mandamentos ao povo de Israel. O ponto aqui não é esse. O que se quer destacar é que, para o dia especial de encontro de Deus com Seu povo, no qual a Santa Lei foi anunciada do alto do monte, os israelitas foram orientados a se purificar e a lavar suas vestes previamente e a não ter relações sexuais com suas esposas no próprio dia da manifestação divina. Aquele dia devia ser dedicado apenas ao Senhor. Todas as atenções deviam estar voltadas para Ele. O sexo não devia ser praticado naquela ocasião. Haveria outros dias para isso.

Aos que insistem em que o sexo é santo e que, por isso, pode ser livremente praticado nas horas sabáticas, vale atentar para o episódio narrado em 1 Samuel 21. Quando Davi solicitou ao sumo sacerdote Aimeleque que lhe fornecesse pão para comer, uma vez que seus homens estavam sem suprimentos, a resposta dada foi que eles poderiam se servir do pão consagrado caso não tivessem se deitado com suas mulheres. Veja-se o relato sagrado: Então, veio Davi a Nobe, ao sacerdote Aimeleque; Aimeleque, tremendo, saiu ao encontro de Davi e disse-lhe: Por que vens só, e ninguém, contigo? Respondeu Davi ao sacerdote Aimeleque: O rei deu-me uma ordem e me disse: Ninguém saiba por que te envio e de que te incumbo; quanto aos meus homens, combinei que me encontrassem em tal e tal lugar. Agora, que tens à mão? Dá-me cinco pães ou o que se achar. Respondendo o sacerdote a Davi, disse-lhe: Não tenho pão comum à mão; há, porém, pão sagrado, se ao menos os teus homens se abstiveram das mulheres. Respondeu Davi ao sacerdote e lhe disse: Sim, como sempre, quando saio à campanha, foram-nos vedadas as mulheres, e os corpos dos homens não estão imundos. Se tal se dá em viagem comum, quanto mais serão puros hoje! Deu-lhe, pois, o sacerdote o pão sagrado, porquanto não havia ali outro, senão os pães da proposição, que se tiraram de diante do SENHOR, quando trocados, no devido dia, por pão quente. (1Sm 21:1-6) Alguns sugerem que o dia em que o sumo sacerdote atendeu ao pedido de Davi e lhe deu os pães da proposição fosse um Sábado, uma vez que, de acordo com a regra de Levítico 24:8, era no sétimo dia que os sacerdotes deviam comer os doze pães que ficavam expostos sobre a mesa do lugar santo e substituí-los por outros doze pães frescos.

1 Samuel 21:6 afirma que Aimeleque deu os pães sagrados a Davi porque só aqueles estavam disponíveis no momento, os quais tinham sido tirados de diante do Senhor e trocados por pães quentes. Existe a possibilidade de que aqueles pães tivessem sido tirados para serem consumidos pelos sacerdotes justamente por ser dia de (ver nota 3 no rodapé)

Reforça essa tese o episódio em que os discípulos de Jesus colheram espigas em dia de Sábado e foram criticados pelos fariseus (Mt 12:1-8). Respondendo aos acusadores de Seus discípulos, Jesus invocou duas situações da história sagrada em defesa deles: a primeira foi justamente o episódio envolvendo Davi e os pães da proposição; a segunda dizia respeito aos serviços realizados pelos sacerdotes no templo mesmo no santo dia de repouso semanal. Em ambos os casos, os atos praticados não eram tidos como reprovados pelo Céu.

Considerando que a segunda situação de que Jesus lançou mão tratava diretamente da santidade do Sábado (o serviço no templo durante o sétimo dia), abre-se a possibilidade de que a primeira situação também estivesse ligada, de alguma maneira, à guarda do dia santo. Isso, porém, não tem como ser cabalmente demonstrado.

Seja como for, o que interessa é que a relação sexual é apresentada em 1 Samuel 21 como incompatível com o manejo de coisas sagradas, o que faz cair por terra o argumento de que, sendo o sexo, nos limites do casamento, algo santo, possa ser livremente praticado durante o Sábado. Embora o sexo seja lícito, isso não implica que sua prática seja apropriada para o dia que é dedicado exclusivamente ao Senhor.

A tudo isso é possível acrescentar o comentário de Paulo sobre a vida matrimonial e o tempo dedicado à oração: Não vos priveis um ao outro, salvo talvez por mútuo consentimento, por algum tempo, para vos dedicardes à oração e, novamente, vos ajuntardes, para que Satanás não vos tente por causa da incontinência. (1 Co 7:5)

Embora esse verso não esteja tratando do Sábado, claramente associa o período dedicado à oração à abstinência da atividade sexual. Ou seja, o casal, de comum acordo, pode combinar de não praticar relações sexuais durante alguns dias para se dedicarem especialmente à oração.

Ora, o Sábado é o dia particular de oração. É um dia dedicado ao Senhor, ao Seu culto, à devoção, à oração e à proclamação do evangelho. Não deveria ser empregado em quaisquer atividades que pudessem ser realizadas nos outros dias da semana, o que inclui o ato sexual.

Mais importante que todos esses argumentos está o princípio em si: afora o culto de adoração, a contemplação tranquila da natureza e a pregação do evangelho, tudo o que não for extremamente necessário deve ficar por fazer até que o Sábado haja passado. Apenas aqueles que não desviarem tempo santo para seus próprios interesses é que hão ser selados com o selo do Deus vivo. O Senhor declara por meio do profeta Isaías: Se desviares o pé de profanar o sábado e de cuidar dos teus próprios interesses no Meu santo dia; se chamares ao sábado deleitoso e santo dia do SENHOR, digno de honra, e o honrares não seguindo os teus caminhos, não pretendendo fazer a tua própria vontade, nem falando palavras vãs, então, te deleitarás no SENHOR. Eu te farei cavalgar sobre os altos da terra e te sustentarei com a herança de Jacó, teu pai, porque a boca do SENHOR o disse. (Is 58:13 e 14)

Alguns tentarão escapar à força dessas palavras argumentando que o ato sexual, no Sábado, visa ao bem do cônjuge, não ao próprio interesse. Caso se siga esse raciocínio, um pai de família poderia se sentir justificado por trabalhar durante as horas sagradas, uma vez que seu objetivo é auferir meios com que sustentar a família. Evidentemente, isso não faz sentido (ver nota 4 no rodapé). Alguns dirão ainda que, em determinados casos, o esposo trabalha fora a semana inteira, permanecendo em casa apenas nas horas do Sábado, sendo, então, a única ocasião disponível para manter relacionamento íntimo com sua esposa. Mas mesmo isso não pode ser aceito: quer dizer que tudo o que ele não tem condições de fazer durante a semana, por estar trabalhando fora, será lícito nas horas do Sábado, inclusive consertar coisas dentro de casa, sair para nadar e correr com os filhos, levar o automóvel à oficina etc.? Em vez de se esforçar por liberar algum tempo, durante a semana, para se dedicar à família e cuidar de outros afazeres, tomará o tempo que o Senhor reclama para Si? (ver nota 5 no rodapé). O Sábado é santo e nenhuma conveniência humana deve levar à flexibilização de sua estrita observância.

Para encerrar este breve artigo, as seguintes palavras de Ellen G. White parecem apropriadas: Há maior santidade no sábado do que lhe atribuem muitos que professam observá-lo. O Senhor tem sido grandemente desonrado por parte dos que não têm observado o sábado conforme o mandamento, quer na letra, quer no espírito. Ele sugere uma reforma da observância desse dia. (ver nota 6 no rodapé) HHLV

Notas de rodapé:

1 “Procurar prazeres, jogar bola, nadar, não era uma necessidade, mas pecaminosa negligência do dia sagrado santificado por Jeová.” Mensagens Escolhidas, vol. 3, p. 258. “Antes do pôr-do-sol, coloquemos de parte todo trabalho material, e façamos desaparecer os jornais seculares.” Testemunhos para a Igreja, vol. 6, p. 355. “Nossos irmãos não podem esperar a aprovação de Deus enquanto põem seus filhos onde lhes é impossível obedecer ao quarto mandamento. Devem esforçar-se para fazer com as autoridades arranjos pelos quais as crianças sejam dispensadas das aulas no sétimo dia. Uma vez que isto falhe, então é patente o seu dever – obedecer os mandamentos de Deus, custe o que custar.” Testemunhos Seletos, vol. 2, p. 182. “Acima de tudo, cuidai de vossos filhos no sábado. Não permitais que eles o violem, pois vós mesmos o estareis violando se consentirdes que vossos filhos o façam. Quando permitis que vossos filhos brinquem no sábado, Deus vos considera transgressores dos mandamentos. Transgredis o Seu sábado.” Mensagens Escolhidas, vol. 3, p. 257.

2 Bíblia Ave Maria, Tradução dos Monges de Maredsous. Disponível em: ,
acessível em: 14 mar. 2018.

3 Não há consenso em torno dessa conclusão justamente porque o texto afirma que o pão colocado em lugar dos que foram tirados era “quente”, o que esbarraria na proibição de assar no Sábado (Êx 16:23). Mas essa dificuldade pode ser contornada caso se conclua que Davi procurara o sumo sacerdote Aimeleque na noite de início do Sábado, tendo os pães sido assados nas horas imediatamente precedentes, ainda durante o dia da preparação.

4 “Mas o mesmo raciocínio poderia demonstrar que os homens podiam trabalhar aos sábados, porque precisam ganhar o pão para os filhos; e não há limite, nenhuma linha divisória a mostrar o que deve ou não deve ser feito.” Testemunhos Seletos, vol. 2, p. 181.

5 “Desagrada a Deus que os observadores do sábado durmam muito tempo no sábado. Eles desonram a seu Criador em assim fazer e por seu exemplo, dizem que os seis dias são demasiado preciosos para que os empreguem para descansar. Precisam ganhar dinheiro, mesmo que seja se privando do necessário sono, que recuperam dormindo durante as horas santas. Depois, desculpam-se, dizendo: “O sábado foi dado para dia de descanso. Não me privarei do repouso para ir à reunião; pois preciso descansar.” Essas pessoas fazem uso errado do dia santificado. Naquele dia especialmente, devem elas interessar sua família na observância do mesmo, e congregar-se na casa de oração com os poucos ou os muitos que ali houver. Devem dedicar o tempo e as energias a cultos religiosos, para que a divina influência os possa acompanhar durante a semana. De todos os dias semanais, nenhum é tão favorável aos pensamentos e sentimentos religiosos como o sábado.” Testemunhos para a Igreja, vol. 2, p. 704.

6 Testemunhos para a Igreja, vol. 6, p. 353.

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